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Que inferno é o teu?

Às vezes tenho a certeza de que o Inferno existe mesmo. Não como um lugar mítico para onde se exilam as almas pesadas de tanto pecar, ou como algum conceito teológico utilizado como arma contra a falta de fé num Deus institucional. O Inferno existe em muitos infernos e inferninhos, aqui mesmo na Terra, e está abundantemente disperso por todo o lado.

A minha definição de Inferno seria a de uma experiência ou estado de espírito envolvendo grande sofrimento, e do qual aparentemente não somos capazes de sair.

A parte do "sem fuga possível" é importante, pois se fosse fácil escapar não seria o Inferno, apenas uma inconveniência temporária. Quanto ao conceito de "grande sofrimento", cada cabeça sua sentença. Ficar preso no trânsito é o inferno dos impacientes, ser rejeitado o inferno dos apaixonados, perder para a Morte alguém que se ama o inferno de todo o ser humano em alguns momentos da sua vida.

Outros infernos não são situações ou circunstâncias, mas antes emoções e pensamentos em circuito fechado que povoam muita da tua atenção consciente. O não saber perdoar, não conseguir esquecer, não parar de enciumar, não vencer a inveja, não deixar o rancor. Estes são infernos muito pessoais, que partilhas com quem te está mais próximo em busca de compreensão que alivie a dor (ainda que temporariamente). 

No fundo, até sabes que a entrega às labaredas da auto-comiseração é voluntária. Mas sejamos francos: as emoções negativas podem ser tão viciantes como as positivas. E quando esse vício se torna verdadeiramente incontrolável, não resistes a propagá-lo. Como sereias malévolas ou demónios da encruzilhada (escolhe a mitologia que prefere ;-), atrais todos os que apanhas no teu raio de acção para contigo multiplicarem o inferno em que vives. Controlas, manipulas, torturas com palavras e acções. Nascem assim os infernos a dois, a três ou a mais.

E quando o teu inferno interior é tão intensos no sofrimento que provoca e na capacidade de contágio que tem, apoderam-se de lugares reais. Vais encontrá-los na tua casa ou no teu local de trabalho. Fogueiras colectivas onde a mente e o coração dos incautos é aprisionado - muitas vezes por inconsciência, mas sempre com o seu consentimento.

O teu mapa astrológico mostra a natureza das tuas maiores aprendizagens e em que áreas da vida encontrarás mais oportunidades de aprender. Às vezes é preciso um verdadeiro inferno para desenvolver em ti a força e a resiliência necessárias para dar avançar na vida de forma saudável.

Porque só encarando o Inferno podes perceber nas suas labaredas os ecos dos teus conflitos interiores, e quem sabe (com um pouco de lucidez) encontrar a melhor forma de ultrapassar esses conflitos. 

Primeira etapa: Reconhecer que o inferno em que vives há-de servir para alguma coisa - encontrar um propósito.

Segunda etapa: Perceber o que aquele inferno em particular te diz sobre quem és - discernir um fio condutor no meio do caos emocional.

Terceira etapa: Decidir sobre a continuidade do inferno - seguir o fio condutor sem receio do que te espera no final, ou permanecer presa por vontade própria, impávida e impotente.

E quando consegues escapar de um inferno? Não há sensação comparável. É mais do que alívio, é libertação. Farta dessa aula interminável (e inflamável!), passas a experiências novas, não importa se boas ou más! Dedicas um pouco de compaixão pelos que ainda lá ficaram, pelos que ainda não descobriram que podem fugir, mas nada mais podes fazer. Não te compete definir, rotular ou julgar os infernos dos outros, muito menos ditar sentenças de quem deve salvar-se e quando.

A cada um, o seu inferno, a sua aprendizagem, a sua responsabilidade por ficar ou partir.

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Pessoa que se afoga no mar em ambiente tempestuoso
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